“O espumante é um produto muito mais do enólogo do que da natureza, se comparado a um vinho branco ou a um tinto tranquilo”, a frase, dita com conhecimento de causa por Christian Bernardi, enólogo com 26 safras de experiência, dá o tom do que poderá ser conhecido – e degustado – a partir do próximo dia 23 e até 26 de setembro em Garibaldi (RS), durante a 14a edição do Concurso do Espumante Brasileiro.
O trabalho dos enólogos é ovacionado por Mario Lucas Ieggli, presidente da Associação Brasileira de Enologia: “O Concurso do Espumante Brasileiro é uma vitrine para mostrar ao Brasil e ao mundo o nível de qualidade que as vinícolas brasileiras alcançaram, fruto de muito trabalho, pesquisa e dedicação. A cada edição, percebemos não apenas o crescimento no número de amostras, mas também a evolução técnica e a ousadia das empresas em apresentar espumantes cada vez mais distintos e representativos de seus terroirs”, destaca.
Bernardi é quem coordena o serviço dos grandes eventos da ABE: é responsabilidade dele a organização e o controle dos bastidores do Brazil Wine Challenge, do Concurso do Espumante Brasileiro e da Avaliação Nacional de Vinhos, a maior degustação coletiva do mundo.
Para ele, a produção do espumante é um desafio: “É quando as ferramentas que o enólogo tem na cantina impactam mais no resultado final”, explica Bernardi. E uma destas ferramentas, diz ele, é o corte.
O corte clássico
O espumante brasileiro, um dos mais premiados do mundo, segue a tradição do Champagne, e aposta no clássico. Apesar de não ter um número cravado, Bernardi assegura que a maior parte dos produtores brasileiros opta pela dupla Chardonnay e Pinot Noir, mesma constatação feita por Juliana Rossatto, enóloga e executiva da Associação de Altos de Pinto Bandeira, que rege a Denominação de Origem Altos de Pinto Bandeira, única específica para espumantes do Novo Mundo.
O blend emblemático francês na maioria das vezes se utiliza de três variedades – Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier – outras quatro são permitidas, mas são muito pouco utilizadas. No Brasil, no Rio Grande do Sul em especial, além da Chardonnay e da Pinot, essa tríade se completa com a Riesling Itálico: “é uma coisa muito brasileira utilizar a Riesling no espumante, não é algo tão consagrado, até porque cortamos com o Itálico, bem mais sutil do que o Renano”, pontua. O enólogo completa dizendo que geralmente a utilização de variedades não vai além de 4 ou 5, o que segundo ele sempre dá certo para os espumantes.
E o corte não fica apenas na escolha da proporção das diferentes variedades de uvas, mas também nas safras e no estilo: “você pode ter um corte de vinhos de diversas safras, ou uma parcela na qual foi feita batonagem e está com volume e complexidade de boca mais intensa, por exemplo. Junte a ele um vinho mais leve, com uma acidez mais pronunciada, são muitas possibilidades”, reflete.
Além disso há ainda segunda fermentação, onde o enólogo pode ter mais uma chance de utilizar uma outra levedura, talvez de uma cepa diferente daquela que fez a primeira fermentação. Agregue ainda o tempo de envelhecimento: “acho que todo esse conjunto de coisas torna o espumante um produto muito mais tecnológico, no sentido de que o enólogo pode interferir ainda mais no resultado”, conclui Bernardi.
Variedades no Concurso do Espumante Brasileiro
Apesar disso, entre as 517 amostras enviadas pelas 101 vinícolas inscritas no CEB há pelo menos 18 diferentes variedades declaradas pelas empresas na composição dos vinhos. “É interessante ter uma série de variedades novas, mas não significa que isso seja impactante simplesmente relacionando elas”, pondera Bernardi, “a casta ode estar em apenas um corte de uma vinícola isolada, e ainda em pequena proporção, dessa forma não é significativa”, avalia.
E também é fato que grande parte dos testes, das apostas e dos experimentos são realizados por vinícolas pequenas, sem tanto compromisso com padrões pré-estabelecidos. Mas Bernardi lembra também que a cada ano vem crescendo o número de vinícolas inscritas: “aumentou muito a quantidade de amostras, de marcas, de produtores, de expoentes no Brasil. Um produtor de uma determinada região pode ter uma Sauvignon Blanc disponível, não é uma uva tradicional e nem mesmo tecnicamente a mais ideal para produzir espumantes, mas é o que ele tem disponível, faz um teste e dentro de um nicho de mercado ele consegue trabalhar bem”.
Mas ainda há um fator bem importante a considerar: o consumidor. Daniel de Carvalho, enólogo da vinícola Peruzzo, de Bagé, é direto: “é até tranquilo testar e produzir coisas novas, complicado é o mercado aceitar. O consumidor final tem muitas vezes um desenho mental sobre o que se trata o espumante e o espumante brasileiro”.
O Concurso
As degustações do CEB seguem as recomendações da Organização Internacional da Vinha e do Vinho: análise às cegas, conduzida por um corpo de jurados especializados. O concurso reúne e avalia espumantes naturais, produzidos de uvas vitis viníferas e que são regularmente comercializados pelas empresas participantes. Os rótulos são inscritos em duas categorias: Segunda fermentação (Charmat/Tradicional) e Primeira fermentação (Moscatéis Espumantes). Uma das atrações é o Prêmio Destaque Sabre de Ouro, concedido ao espumante que se sobressair entre os que conquistarem Medalha de Ouro e melhores medianas, a partir de uma degustação de preferência realizada pelo júri.
Fotos: Jeferson Soldi | divulgação ABE
Para sugestões de matérias escreve para [email protected].
As matérias publicadas em nosso site podem ser reproduzidas parcialmente, desde que constando o crédito para Brasil de Vinhos e publicando junto o link original da reportagem.
Para nos prestigiar e manter o Brasil de Vinhos atuando, assina nosso conteúdo exclusivo no feed do instagram.
Para anunciar, escreve para [email protected] e fala conosco.