A Aura Astral, suas vinícolas incubadas e seus vinhos

A Aura Astral, suas vinícolas incubadas e seus vinhos

Qual é o conceito de Incubadora?

Um local que facilite negócios e conexões? Um espaço com infraestrutura adequada e profissionais habilitados? Um ambiente que faça as ideias aflorarem na prática? Tudo isso junto e ‘otras cositas más’? Mas o que isso tem a ver com vinho?

Pois esse é o conceito da Aura Astral, uma das mais novas vinícolas de São Roque (SP). O negócio nasceu da parceria do produtor Alex Moraes, da XV de Novembro, com a enóloga Maritê Dal ‘Osto, professora de Enologia no Instituto Federal Campus São Roque, a dupla percebeu a necessidade do mercado e juntou as competências para aproveitar a oportunidade. Hoje já tem 12 clientes em seu portfólio.

“A ideia é vinificar para as empresas que já plantam ou que começaram o plantio de uvas, mas não tem estrutura de vinícola e talvez nem pensem nisso”, diz Maritê. Um dos diferenciais do negócio, segundo a enóloga, é a produção de volumes pequenos, microlotes e vinhos com mais valor agregado, quase todos com passagem por barrica ou com processos pensados para resultar em vinhos com maior potencial de guarda.

A Aura, digamos assim, é uma espécie de ‘vinícola-mãe’ de várias marcas. Hoje, contando seus próprios vinhos, vinifica doze, seis do Sudeste, três de São Paulo – Dom Alonso, Infinitas e Raízes do Baú (foto acima) – duas de Minas Gerais – Fazenda Alegria e Fazenda Balerini e uma do Rio de Janeiro – Estância da Bocaina, além de outras seis de São Roque – Alma Galiza, Don Patto, Vinhos Frank, Terra do Vinho e XV de novembro (a linha Quinta Moraes), além de seus próprios rótulos.

O ponto mais alto da região

São Roque é uma cidade que tem amplitude térmica de cerca de 15o C e uma altitude de aproximadamente 800 metros acima do nível do mar. O ponto mais alto fica na fazenda Bagadá (foto acima), onde estão os vinhedos da vinícola Alma Galiza, com plantio a 1.050 metros de altitude.

Junto com a Aura Astral é das mais novas da cidade, e está bem dentro do perfil desenhado pela enóloga Maritê: a ideia é produzir uvas de extrema qualidade e, enquanto a quantidade produtiva não exigir, vinificar com a empresa parceira.

“Hoje temos cerca de 9 hectares plantados com 32 mil pés de sete variedades: Sauvignon Blanc, Lorena, Chardonnay e Albariño, nas brancas; Tempranillo, para a produção de rosés; Syrah e Cabernet Franc”, conta Leodir Ribeiro (foto acima), proprietário da vinícola e presidente do Roteiro do Vinho. Mas o vinhateiro já faz planos: “temos reservada no total uma área de 10 hectares para vinhedos, quando atingirmos os 40 mil pés nosso negócio já viabilizaria a construção de uma cantina”, antecipa, falando também em nome do sócio Paulo Franzine. Pelo que imagina, isso deve acontecer entre os anos de 2027 e 2028.

Caminhar pelos vinhedos ao lado de Leodir é praticamente meditar. A fala tranquila e pausada intercala as informações sobre a história do município, o entusiasmo pela filha arquiteta que aos poucos se envolve no mundo do vinho, a paixão que tem pelos costumes da região de Santiago de Compostela onde morou por dois anos – cuja capital, Galiza, dá nome à vinícola – e o amor que tem pelas uvas e por este estilo de vida.

A vinícola é cheia de belos cenários e dois deles certamente são a capela, em estilo espanhol, e a possibilidade de avistar, ao longe, o morro do Saboó, o ponto mais alto da região – tudo dentro de uma área de 40 alqueires perfeita para Enoturismo e grandes eventos, como casamentos.

A Alma Galiza está instalada na fazenda Bagadá – uma palavra estranha só até aprendermos que é o coletivo de bagas.

A Gamay de São Roque

Conhecida por ser uma uva mais delicada que resulta no famoso Beaujolais Nouveau – o primeiro vinho da safra, que ganha uma comemoração anual na região de Beaujolais, na França – essa uva não tão usual no Brasil é uma das apostas da Don Patto para os próximos anos.

“Não é muito trabalhada no estado de São Paulo, ainda mais no sistema de Dupla Poda e também não é muito utilizada comercialmente no Brasil”, explica o enólogo Giovanni Fatobene (na foto acima, junto à Gamay), “nossa ideia é testar e ver como ela se comporta em nosso terroir”, explica. A Vila Don Patto tem um vinhedo experimental de um hectare com cerca de 3 mil mudas divididas entre sete variedades viníferas, cinco delas pensadas para colheita de Inverno, entre elas a Gamay.

A vinícola, fundada por José dos Santos Patto na década de 1910, um português vindo da região de Monção e Melgaço, é um verdadeiro centro de entretenimento e Enoturismo. “Quando ele chegou ao Brasil começou a vida como alfaiate”, conta Fatobene, “a vinícola passou a existir oficialmente em 1932”. Como todas, a Don Patto começou com as uvas de mesa – que ainda tem e é seu principal produto (foto abaixo): “nos domingos, no restaurante, 80% do vinho vendido ainda é de mesa”, conta o enólogo, que trabalha na vinícola desde 2023. Hoje a Don Patto cultiva BRS Lorena e Alvarinho, no ciclo de verão; Cabernet Franc, Gamay, Touriga Nacional, Marselan e Syrah, no cultivo de inverno.

Com o passar do tempo a visita do turista passou a ser também um grande atrativo: atualmente há uma infinidade de experiências que podem ser aproveitadas, desde piquenique sob o parreiral e acompanhamento da vindima, até um passeio de carretão pela propriedade, indo até o vinhedo experimental onde estão sendo cultivadas as uvas que, depois da colheita, são enviadas para a Aura Astral e XV de Novembro onde são vinificadas.

Novidades são esperadas para breve: já está pronto o novo projeto da Don Patto (reprodução acima), elaborado por Vanja Hertcert, especializada em arquitetura de vinícolas.

Emoção e simplicidade

Fabricio Antiqueira é um cara tímido, mas que dá um sorriso largo e fica extrovertido quando abre as portas do casarão Eternus (foto acima), sede da Vinhos Frank. O local durante muitos anos foi a casa onde moraram seus avós, Frank e Ferdinanda (foto abaixo): o nome da sede é uma declaração de amor aos dois. “Meu avô fazia vinho aqui no porão”, recorda Fabricio emocionado, mostrando o local, “até que uma denúncia o impediu de continuar com essa tradição e foi então que ele começou a vinificar com a XV de Novembro, o que continuamos fazendo desde aquela época”.

Como a grande maioria da região, a história da Frank começa com os vinhos produzidos a partir das uvas de mesa, Isabel, Seibel e Niágara, mas desde os anos 2000 a vinícola já comercializa vinhos finos. Os varietais de Marselan e Malbec, por exemplo, são produzidos na Serra Gaúcha, mas a Frank também compra uvas de produtores de Santana do Livramento, na campanha Gaúcha, e de Itaí, em São Paulo, para vinificar na Aura Astral.

Terceira geração, Fabricio entrou no negócio em 2011, em 2022 lançou a linha Eternus e prepara um novo passo para 2026. No fundo do casarão, uma área já começou a ser preparada para a implantação de pelo menos 1 mil mudas de Touriga Nacional e Ribas, a queridinha da região. “A Ribas vamos implantar em sistema de latada e usar também o espaço para Enoturismo”, relata, explicando que as duas variedades serão fornecidas pela Vitácea. Fabricio também gostaria de cultivar alguma variedade italiana, mas ainda tem dúvidas de qual seria a mais adequada.

O vinho do Drácula

Falamos de várias vinícolas e suas trajetórias, e propositalmente deixamos pro final a Aura Astral, que de um modo ou de outro se envolve com todas as vinícolas que apresentamos acima.

Vinícola boutique com foco em pequenas produções, trabalha apenas com uvas viníferas, e com elas produz espumantes, pelo método tradicional, e vinhos tranquilos – nesse caso cerca de 90% deles são barricados. Exceção seja feita aqui: uvas de mesa ou híbridas podem ser utilizadas em caso de desenvolvimento de produtos próprios, como no caso do Pet Nat de Isabel, por exemplo. A mesma coisa quando se fala de uma cultivar muito nova como a Ribas também, com a qual os produtores ainda estão aprendendo a trabalhar.

Atualmente, além de prestar serviços como incubadora, a Aura Astral tem uma linha de entrada com dois vinhos, um rosé e um branco, mais leves; depois o Papilio, um Chardonnay fermentado em barrica e ainda o Achiles, um Tannat com 12 meses de barrica francesa. Produzem ainda o Pupa, um espumante sur lie, e a linha Panapanã (foto acima), com um Pinot Noir rosé, um Syrah blend de barricas e em breve um espumante de Pinot Noir na mesma linha, entre outros produtos ainda em desenvolvimento ou em fase de finalização de rótulos.

E se tudo isso fosse pouco, há na vinícola algumas barricas da Transilvânia, na Romênia (foto de topo, com Maritê), que vieram em uma importação – e até onde Maritê saiba, a Aura Astral é a única vinícola que as possui. Estas barricas durante 24 meses guardaram um Syrah, que agora repousa há pouco mais de um ano nas garrafas: “o vinho vai se chamar Imortalis, e devemos lançar mais perto do inverno’, diz a enóloga, “será o nosso ícone”, finaliza

 

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O Brasil de Vinhos viajou a São Roque (SP), a convite do Sindusvinho e do Roteiro do Vinho.

Fotos: topo e Panapanã Cintia Moares, restantes Brasil de Vinhos | Lucia Porto.

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