Isso é o que afirma Gabrielle Vizzavona (foto), crítica de vinhos, jornalista, professora e master trainer, que tem dupla formação em economia (MSC em economia) e vinho (Mestrado em gestão pela OIV, Diploma pela WSET), em entrevista à jornalista Emmanuelle Thomas. A especialista compartilhou com os leitores da revista francesa Viti, suas percepções sobre as expectativas atuais e futuras dos consumidores. A entrevista abaixo, em tradução realizada pela equipe do Brasil de Vinhos, foi reproduzida com a autorização dos editores da publicação original, que pode ser conferida na íntegra, em francês, clicando aqui.
O que os consumidores esperam do vinho?
Nosso paladar é formado em grande parte na infância, a partir dos alimentos aos quais somos expostos – de certa forma nossa herança gustativa, que vai se transformando ao longo de nossa vida de acordo com as influências que recebemos. Hoje, se pensarmos no vinho, as expressões que ditam as regras são facilidade de beber, um paladar agradável e fruta. E a tendência também está se movendo em favor de uma certa vivacidade. Quanto ao envelhecimento, passamos de um excesso assumido dos vinhos, ditado pelo mercado americano, para um envelhecimento mais sutil, aumenta nossa capacidade de ampliar as percepções, ao invés de aromatizar em demasia. Também pude observar uma maior valorização, nos últimos anos, do amargor como catalisador do final de boca, que agrada muito quando bem controlado. Isso vem provavelmente sob a influência dos nossos vizinhos italianos, que produzem belos bitters.
O consumidor está cada vez mais sensível a produtos que expressam a identidade de um lugar e ao meio ambiente, tendência que será reforçada ainda mais com a chegada dos consumidores da Geração Z. Vejo isso com meus alunos, a geração ‘Greta Thunberg’ tem em uma abordagem muito mais global além do meio ambiente. Eles estão interessados também no impacto geral da produção e não apenas nos insumos.
Acho que os viticultores de abordagem artesanal — que não apostam nas certificações reconhecidas pelo consumidor (Orgânica, Demeter, etc) – terão cada vez mais dificuldades nos mercados.
Que conselho daria aos viticultores para uma melhor comunicação com os consumidores (sobretudo nas redes sociais)?
Uma grande parte dos consumidores compra a história por trás do rótulo. É mais fácil nos identificarmos com o enólogo que personifica o seu vinho ou a uma história do que a uma garrafa – sobretudo quando ainda não provamos o vinho. Os viticultores costumam apresentar dados técnicos que interessam apenas aos profissionais do setor e a um punhado de aficionados. Para ter uma comunicação eficaz nas redes sociais, você tem que ser regular e concordar em dar um pouco de si, da sua história. E por isso mesmo é muito difícil delegar essa atividade: o objetivo é criar um vínculo, uma emoção.
O consumidor espera uma mistura de educação e entretenimento ao mesmo tempo em que quer ser questionado sobre sua opinião, para interagir com o conteúdo. Hoje temos um consumo midiático multi-telas ou seja, consultamos muitas fontes às vezes ao mesmo tempo, o que também torna nossa atenção mais volátil, por isso é importante se destacar com sua identidade visual e sua mensagem. Com o desenvolvimento do digital, cada vez mais ferramentas estão disponíveis e permitem brincar com diversos tipos de conteúdo. Claro, isso dá mais uma tarefa ao viticultor – que já tem muitas!
Como fazer com que as vinícolas cheguem na imprensa?
Antes de mais nada, é preciso apresentar o vinho o máximo possível, para que o produto seja notado: esta é a base, mas é verdade que muitos não participam. Sabemos que o sabor acima de tudo é o que vai chamar a atenção, depois as novidades, a inovação, a originalidade, tudo o que se destaca é sempre atrativo porque o jornalista procura sobretudo uma boa história ou uma exclusividade. Para uma vinícola, ter uma marca eficaz exige também consistência em todos os elementos da sua comunicação, na sua história, na sua identidade visual, no seu espaço público…tudo isso se expressa em todos os seus suportes e canais (site, redes sociais, press kits, etc.). É o trabalho que faço sobre a identidade e os elementos da linguagem com as propriedades que acompanho; há que produzir fotos bonitas, personalizar o negócio, ter imagens disponíveis em alta definição: tudo é prioridade. Estamos num mundo dominado pela visão – mas sabemos isso nem sempre é possível para pequenas vinícolas. Pense em coisas diferentes, exclusivas, pare com as fotos banais de cachos de uva.
Como você vê a evolução das tendências no mundo do vinho, na França e no exterior?
Estou neste momento preparando uma série de podcasts dedicados aos vinhos do futuro, entrevistando diferentes perfis de personalidades do vinho pelo mundo para a Vinexpo. Olhar para frente, para daqui a 50, 75 anos é um exercício difícil… Na França surgem muitas questões em nível ambiental, como a necessidade de adaptar as regulamentações às alterações climáticas, principalmente no que diz respeito à irrigação. Para mim, a força das marcas deve aumentar no futuro, mas o seu número deve diminuir: atualmente, assistimos a uma multiplicação delas, mas penso que a longo prazo haverá apenas um punhado de rótulos ditos sérios. A credibilidade destes depende também da sua imagem e da sua utilização.
Nos países do Novo Mundo aumentará a tendência para a territorialização, para a criação de mais valor, seguindo o exemplo europeu. Do lado da vinificação, sentimos um aumento na diversificação dos recipientes e das embalagens… mas muitas coisas ainda não são aceitas na França, como a tampa de rosca, por exemplo. Isso é uma constatação: mesmo que sejamos cada vez menos conservadores, ainda não estamos livres do peso de nossa cultura.
Mas isso pode não ser tão ruim assim!