Alagamentos, cheias, prejuízos e perdas nos estoques de vinho em Porto Alegre

Alagamentos, cheias, prejuízos e perdas nos estoques de vinho em Porto Alegre

Estruturas alagadas, garrafas submersas e um cenário que não permite que as pessoas enxerguem a extensão dos danos causados pelas cheias em seus negócios. Essa é a situação em que se encontra a Vinhos Por aí (foto acima. Arquivo pessoal Gisa Guerra), da empresária Gisa Guerra, e na qual estão muitos outros profissionais do setor vitivinícola no Rio Grande do Sul. Enquanto alguns acompanharam e registraram a destruição em seus espaços de trabalho, outros ainda não conseguiram acessar os locais para entender o que foi danificado. A loja de Gisa, que fica no bairro Humaitá, em Porto Alegre (RS), seguia inacessível pelo volume de água que invadiu o prédio até quarta-feira (15). Sem mais informações, a projeção é que tenha perdido toda mercadoria do local. Ao sair do bairro, no dia 6 de maio, Gisa ficou com a incerteza do futuro e o medo do que viveu nos dias anteriores.

“Hoje eu não tenho ideia de como está o interior da loja, não posso vender e não posso ir lá saber se tenho algo ainda para comercializar. Também vivemos com medo dos saques, pois antes de sair do bairro, eu e meus pais presenciamos pessoas com água no peito carregando televisões e eletrodomésticos roubados”, recorda a comerciante. “Passamos quatro dias sem dormir, era barulho de tiro e gritaria, não sabíamos se era assalto ou resgate de pessoas. Foram momentos que eu não sei se um dia vamos apagar da memória”, revela.

“Ao termo ‘perder tudo’ cabem muitas interpretações”

Assim como Gisa, Tomaz Saleme, da Vinho Justo, ainda não sabe o que restou do espaço. A empresa que fica no bairro Navegantes, também segue com água na porta. Apesar do futuro da empresa indefinido, buscou forças para poder ajudar quem precisa, mobilizando campanhas de arrecadação e entregando donativos. No momento, a força da solidariedade é o que o mantém firme.

“Estou me movimentando porque eu não posso ficar parado e desabar. Se for assim, eu não consigo ajudar os outros e sem isso, o que estou fazendo? Depois que a água baixar, eu vejo o que sobrou do Vinho Justo, nem quero pensar nisso agora”, aponta Tomaz, que tenta analisar o momento por outra perspectiva. “Ao termo ‘perder tudo’ cabem muitas interpretações. Mas eu vejo minha filha saudável, e depois de tudo que acompanhei, acredito que quem realmente perdeu tudo é quem teve morte na família. Eu não posso dizer que eu perdi tudo, eu perdi todo meu estoque, mas minha família e meus funcionários estão bem”, pondera o empresário.

Para Everton Silva, da Bebidas do Sul, as últimas imagens das câmeras de segurança interna (foto acima. Acervo pessoal Everton Silva) mostram apenas parte do estrago causado. Desde que faltou luz, não há atualização sobre a situação do estoque e equipamentos. Através de um vídeo enviado por um amigo que passou de jet ski pelo bairro Santa Maria Goretti, onde fica o estabelecimento, percebeu que a água baixou em relação aos dias anteriores, mas sabe que voltou a subir pela atualização das notícias sobre a enchente, impossibilitando a operação em qualquer nível.

Vinícolas perdem estoque que estava em Porto Alegre

Para alguns produtores de vinho, o estrago não atingiu o plantio e estruturas de operação no local onde fica o vinhedo e a cantina, mas afetou o estoque armazenado em Porto Alegre. No caso da Vinícola Cárdenas, o vinhedo não teve dano, no entanto, o centro de distribuição ficou alagado. Foram mais de 5 mil garrafas, ânforas, equipamentos, veículos, caixas e kits de Dias das Mães que‎ foram‎ perdidos nas‎ águas. O prejuízo estimado por Renato Cárdenas supera R$ 1 milhão. No momento, com produtos danificados e sem acesso ao estoque maior que fica na sede da vinícola, em Mariana Pimentel, o produtor diz que a atuação ficou limitada a 8% da capacidade normal, contando apenas com envios do seu centro de distribuição em São Paulo. Apesar do contexto, os envios seguem para todo país e quem quiser comprar para ajudar pode pedir os rótulos através do site.

“Estamos com dois metros de água no centro de distribuição em Porto Alegre. Tenho mais dois estoques, o maior fica na vinícola e não foi afetado, mas não tenho acesso pois as estradas estão bloqueadas. O único que posso operar fica em São Paulo, que segue mandando vinhos para todo Brasil, menos para o Rio Grande do Sul. É muito difícil, vamos passar o mês de maio debaixo d’água”, lamenta Renato.

A vinícola Routhier & Darricarrère, localizada em Rosário do Sul, na Campanha Gaúcha, ainda não sabe a extensão dos danos após entrar mais de um metro e meio de água no centro de distribuição que fica em Porto Alegre, no bairro Navegantes. O espaço concentrava 30% da produção, sendo fundamental para logística da operação que envia vinhos para Santa Catarina, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Para seguir trabalhando, Julio Gostisa aumentou o custo de envio pela necessidade de dois fretes, um para capital dos gaúchos e o segundo para os outros estados, pois a sede da transportadora que recebe a mercadoria de Rosário do Sul e entrega, também está alagada. Mesmo com despesa maior, a Routhier segue mandando seus produtos para os estes estados e conta com a solidariedade dos clientes para seguir operando.

“Compradores de fora do estado estão comprando vinhos gaúchos e tentando ajudar”, diz o produtor. “Mas no Rio Grande do Sul não vendi nada, aqui as cidades estão traumatizadas, não vamos ter pedido de vinho no estado por um bom tempo. O ano das vinícolas gaúchas vai ser muito difícil, é uma tragédia regional e coletiva sem precedentes”, lastima Gostisa.

 

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