De Taquara para Nova Iorque

De Taquara para Nova Iorque

“Eu sempre sonhei em poder apresentar meus vinhos em uma feira dessas”, diz Rubem Kunz, falando sobre a Raw Wine. O cardiologista enche a boca pra dizer isso – e com razão. Também pudera: a vinícola que criou e administra em família, a Vinhos da Rua do Urtigão, é o Brasil entre os cerca de 3 mil produtores listados no site Raw Wine – a maior comunidade do mundo de produtores de vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais de baixa intervenção. Isso já seria bastante, mas ainda tem mais: a vinícola localizada nos fundos da casa de Rubem e Valéria em Taquara (RS), a cerca de 100 quilômetros de Porto Alegre, será a única brasileira presente na feira Raw Wine de Nova Iorque, que se realiza em novembro de 2024.

É o sonho de Rubem se tornando realidade.

Para contextualizarmos a importância da Raw Wine – comunidade e feira – é importante falarmos em Isabelle Legeron, a francesa que foi a primeira mulher a receber o título de Master of Wine da França. Nascida na região de Cognac, na infância viu os pais e avôs cultivando uvas e as destilando para fazer conhaque, mas com o passar do tempo, migrou para o vinho. Isabelle fez o caminho clássico de formação até que o vinho natural entrou em sua vida e ela passou a trilhar outro caminho, optando por ‘dedicar seu trabalho a ajudar as pessoas a pensar sobre o que bebem e a promover a necessidade de transparência no mundo do vinho’. Desta forma, em 2012 ela criou a Raw Wine, que desde então cresceu para se tornar a maior comunidade mundial de produtores de vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais de baixa intervenção, com clube de vinhos, loja online e feiras – hoje em 8 capitais do mundo. Além de Nova Iorque, estão em Londres, Los Angeles, Toronto, Montreal, Tóquio, Copenhagen, Berlim e Paris.

“Atualmente 2.935 viticultores e vinhateiros que fazem parte da Raw Wine”, conta Kunz, que logo se corrige “na verdade agora 2.936, lembra, sorrindo.  A entrada da vinícola aconteceu de uma forma despretensiosa: “Há cerca de dois meses visitei o site, fiz o cadastro e contei um pouco da história da nossa vinícola familiar, pequena e da vinificação com mínima intervenção”, diz. Cerca de 15 dias depois, Kunz recebeu um e-mail pedindo informações, com detalhes mais específicos sobre ele, a procedência das uvas que utiliza, como são cultivadas, os métodos de vinificação, se ocorre ou não a fermentação malolática, se são utilizadas leveduras nativas ou selecionadas, se é feita alguma correção, quais os produtos utilizados, se usa ou não controle de temperatura, como clarifica e se filtra os vinhos – uma série de perguntas bem técnicas. “Teve algo que senti que valorizaram muito: enviei a análise de laboratório de 10 vinhos, comprovando que ocorreu a malolática”, argumenta. “E isso é muito valorizado, porque para impedir a fermentação malolática é necessário adicionar um produto”, esclarece. Além disso, lembra Kunz, o laudo mostra também o nível de anidrido sulfuroso – SO2 – livre e total nos vinhos: “foi algo que mencionaram depois que acharam muito interessante”.

A partir dali – e com o aval de António Marques da Cruz, da Quinta da Serradinha, Pepe Moquillaza, da La Gruta e Pietra Possamai, da bodega Murga, membros da Raw Wine que chancelaram sua participação – a vinícola Vinhos da Rua do Urtigão passou a fazer parte da Raw Wine.

“No início confesso que não estava ‘levando muita fé’”, disse o vinhateiro”. A dúvida era legítima: a Vinhos da Rua do Urtigão trabalha com apenas duas uvas orgânicas, a Bordô, certificada pelo Ecovida, que vem do município de Araricá – que resultou no “da terra”, de 2019 (foto acima), que Rubem suspeita ter sido um dos motivos da escolha da vinícola, e a Isabel, orgânica, ainda não certificada, de Nova Petrópolis. “Teremos também as uvas certificadas do vinhedo da Quinta, de Encruzilhada do Sul, que está em transformação, passando de convencional a orgânico. Mas isso leva tempo”.

Mas o temor de não realizar um de seus sonhos foi breve: “para minha alegria recebi um e-mail dizendo que a vinícola estava aceita na comunidade”, comemora. A devolutiva de Rubem foi direta: “quero fazer parte da feira de Nova Iorque”.

E deu certo, Rubem, Valéria e a família dos Vinhos da Rua do Urtigão serão o Brasil em Nova Iorque, em novembro de 2024.

Good luck, we’re proud of you.

 

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