Incertezas ameaçam quantidade e qualidade das safras
As mudanças climáticas têm sido pauta constante em jornais de todo o planeta, principalmente pela urgência do tema e seus impactos sociais e econômicos. Na indústria vitivinícola, obviamente, não poderia ser diferente. Volume de chuvas, amplitude térmica e intensidade solar afetam diretamente a qualidade das uvas e, consequentemente, do vinho. No Brasil, já é possível observar algumas particularidades nas safras. Mauro Zanus, pesquisador da área de Enologia da EMBRAPA aponta o assunto das mudanças climáticas no hemisfério sul como “bastante complexo”.
Os impactos, no entanto, já são percebidos. “No ano passado, por exemplo, tivemos diversos eventos, seja o La Niña, com influência para seca ou El Niño, para mais chuvas” explica Zanus. “Por exemplo, no ano de 2016, em que houve muita chuva, a quantidade e qualidade da safra foram enormemente prejudicadas”, completa.
Em artigo recente publicado pela revista portuguesa Vida Rural, foi apontado que “a multiplicação dos eventos climáticos extremos vai continuar a impactar o crescimento da produtividade agrícola” na União Europeia e, por isso, “o consumo de vinho deverá diminuir”.
Esta questão, entretanto, é global. A agência de notícias BBC também publicou artigo expondo como as mudanças climáticas ameaçam a produção de vinhos australianos. A solução, dizem os Ratcliffs – uma das famílias produtoras de vinho mais tradicionais do país – é a adaptação.
Entretanto, a real sensação que temos ao tratar desse assunto é incerteza. O pesquisador explica que não é possível atribuir os eventos deste ano a uma coisa sólida e única. A diferença, segundo ele, é que agora se tem evidência de que as estações estão mais incertas do que no passado.
“Temos eventos de calor durante o período do inverno que podem antecipar a brotação, e consequentemente, quando se tem uma geada na primavera, ela é mais danosa”, diz Zanus, apontando o desafio crescente para a indústria, que afeta tanto a quantidade quanto a qualidade das safras.
Em relação à colheita atual, o pesquisador observa que “este ano, em particular, a primavera esteve muito mais chuvosa”. O inverno ameno também prejudicou o volume de produção das uvas, principalmente na fase da floração. “Além de demandar mais custos, mais doenças têm ocorrido, particularmente o míldio” aponta o pesquisador.
Quanto à qualidade, ainda é cedo para diagnósticos, mas o futuro exige cautela. “Vai depender de como for o tempo daqui pra frente. Se tiver um nível de chuvas acima do normal, podemos ter dificuldade em produzir vinhos de alta gama”, aponta. “Por outro lado, para vinhos espumantes pode ser que a safra ainda seja muito boa”, finaliza Zanus.
Diante destes desafios, a necessidade de adaptação torna-se evidente. As incertezas em relação às safras futuras e qualidade dos vinhos já acendem um sinal de alerta para os produtores que precisam estar preparados para lidar com uma imprevisibilidade cada vez maior.