O valor estabelecido para uvas utilizadas na produção de vinhos (com nível de doçura de 15° glucométricos) foi definido em R$1,69/kg para 2025, de acordo com portaria do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Esse preço é anualmente estabelecido pelo Governo Federal, a partir do Conselho Monetário Nacional (CMN), a fim de assegurar o abastecimento das uvas e regular o mercado. O valor representa um aumento de R$ 0,19 em relação aos R$ 1,50 da safra de 2024 e leva em conta fatores relacionados aos custos de produção. O reajuste traz alívio para produtores, mas ainda está distante da realidade praticada no mercado, que oferece preços mais de oito vezes maiores. O preço de R$ 1,69/kg estabelecido pelo Governo pode chegar a até R$ 14,00/kg, como por exemplo no caso da Sauvignon Blanc, comercializada em Santa Catarina.
Como é estabelecido o preço mínimo da uva?
Segundo Ricardo Pagno, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Flores da Cunha e Nova Pádua e coordenador da Comissão Interestadual da Uva, o preço estabelecido para a safra atual é uma vitória para os produtores: “É um dos únicos anos em que o Governo realmente estabelece o custo mínimo de acordo com o que foi levantado por nós”, conta Pagno.
O valor apurado pelo sindicato ficou entre R$1,68 e R$1,72 e leva em conta o custo médio de produção incluindo insumos, equipamentos, maquinários e mão de obra, familiar ou contratada. Pagno explica que o valor sugerido por eles ao Governo é definido a partir de um cálculo baseado em uma produtividade média de 20 toneladas por hectare e conta com a participação do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).
De acordo com Pagno, esse número serve para proteger o produtor de vendas a preços irrisórios e não leva em conta custos variáveis como o desgaste de materiais e investimentos necessários para a produção. “É um valor que existe como se o produtor tivesse o parreiral pronto, tendo apenas que produzir a uva. Não leva em conta o lucro”, destaca o sindicalista. Para ele, o preço que levaria em conta um lucro mínimo ideal seria de R$ 2,30, para que o agricultor pudesse reinvestir em seu trabalho. Ainda assim, há situações de mercado em que as uvas são vendidas abaixo do custo mínimo estabelecido em cada ano.
A Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) é responsável por dialogar com o setor produtivo. Dessa forma, recebe a sugestão da Comissão Interestadual da Uva e elabora as propostas de preços mínimos, que então têm seu valor definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Segundo a CONAB, o custo definido leva em consideração o cenário de cada cultura: “Os critérios para isso estão estabelecidos no Decreto-Lei n.º 79, de 19 de dezembro de 1966, podendo ser os diversos fatores que influam nas cotações dos mercados, interno e externo, os valores de transporte até os centros de consumo e portes de escoamento”, relata a instituição. A CONAB explica ainda que, para a safra de 2025, foi levado em consideração principalmente a alta dos preços dos defensivos agrícolas, fator que causou mais impacto na elevação dos custos de produção.
O valor da uva na prática
Rafael Alex Vicchini, engenheiro de alimentos e sócio da EnoConexão, empresa de Jundiaí (SP), que trabalha com a comercialização de uvas, conta que na prática é diferente: “O que realmente dita a regra do jogo é a oferta e procura”, explica. Segundo ele, variedades como Bordô (foto acima, crédito Rafael Vicchini) e Isabel, muito demandadas para sucos, frequentemente têm preços acima da tabela, enquanto outras seguem mais alinhadas ao custo mínimo. Entretanto, quando falamos de uvas viníferas, Vicchini observa outra realidade: “Nesse caso, nem entra em vigor a questão da tabela. De fato é lei de mercado mesmo”, relata o empreendedor.
Segundo ele, em 2025 está sendo desafiador trabalhar a compra e a venda de uvas direcionadas a espumantes como Chardonnay e Pinot Noir, devido a quebras nas safras passadas e estoques reduzidos de espumantes: “Estamos optando por não comprar algumas variedades, porque não está sendo possível trabalhar um valor de revenda. É uma alta que nunca presenciei em 15 anos de experiência no mercado”, relata. Esse ano, os valores dessas castas encontrados por Vicchini ficaram entre R$7,50/kg para uvas de latada, um preço que ainda seria viável para compra, e R$ 12,00/kg para as de espaldeira. “Dentro da nossa linha de produtos, pensando em comercializar essas uvas em São Paulo, a conta não fecha”, lamenta o empresário. Vicchini conta ainda que, por outro lado, as demais tintas tomam a direção oposta, com maior oferta, menor procura e preços mais estáveis ou em queda: “Isso se deve principalmente à redução do consumo de vinhos tintos e ao crescimento da produção em novas regiões do Brasil, que ampliaram a disponibilidade dessas uvas no mercado”, relata o empreendedor.
Por outro lado, quando a oferta é pouca os preços sobem. No Rio de Janeiro, região que vem crescendo em número de empreendimentos, José Carlos Eloy, sócio-proprietário da Borgo Del Vino Gran Reserva, localizado em Areal, na Serra Fluminense, relata que no ano passado o valor das uvas chegou a R$20,00/kg em e o aumento do preço mínimo em R$0,19/kg agora não deve nem servir como um balizador para os valores que virão em 2025. Segundo ele, isso se deve ao fato de que a região trabalha com Dupla Poda: “É um processo muito mais custoso. Temos o dobro de poda, adubação, pulverização e o preço acaba subindo porque não há concorrência”, explica Eloy.
FOTO CAROLINA ROJAS
Carolina Rojas Ferraz, enóloga proprietária da Vinhedos do Monte Agudo, em São Joaquim (SC), realiza vendas de uvas e também demonstra que o que prevalece é a lei de mercado. Ela conta que o preço mínimo é distante da realidade na prática que vinicultores vivenciam diariamente: “Aqui em Videira, as uvas de mesa mais baratas você encontra em torno de R$5,00/kg”, relata. Segundo a enóloga, quando o assunto são as uvas viníferas, Chardonnay, Sauvignon Blanc, Merlot e Malbec, é possível perceber um aumento considerável dos valores. Em 2024, Carolina vendia sua produção da Sauvignon Blanc (foto acima, crédito Carolina Rojas) na cidade de São Joaquim (SC) a R$9,00/kg, mas em 2025 o preço cobrado varia entre R$13,00 e R$14,00/kg. Já em Videira (SC), o valor cobrado na região foi de R$ 5,00 e R$ 6,00/kg em 2024 para R$7,00 e R$ 8,00/kg em 2025.
Na visão de Heleno Facchin, sócio da Cooperativa Nova Aliança, do Rio Grande do Sul, as condições climáticas deste ano colaboram para uma qualidade maior das uvas e a safra de 2025 pode ficar marcada na história e todos saem ganhando: “Uma safra de melhor qualidade, sadia, sempre faz o viticultor ter uma receita maior, se diferenciar no mercado e ser reconhecido por isso”. Segundo ele, os preços médios do quilo da uva, na prática de mercado, não devem se diferenciar expressivamente do ano anterior. Facchin destaca que, em 2024, o custo mínimo da uva era estabelecido em R$1,50/kg e o valor real girou em torno de R$1,80 e R$2,00/kg para tintórias, mas reitera que isso não necessariamente reflete a realidade do mercado como um todo. Ele também reforça a ideia de que o viticultor é o centro da cadeia produtiva: “Trabalhamos em todas as pontas para que o viticultor tenha um negócio rentável enquanto cooperativa”, conclui Facchin.
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