Sozo, um jardim de experiências em busca de novas aptidões para a região 

Sozo, um jardim de experiências em busca de novas aptidões para a região 

Esta é a última das três publicações produzidas em Campos de Cima da Serra, uma região vitivinícola não tão conhecida dos brasileiros, mas que merece um olhar com mais atenção a seus vinhos, paisagens, atrações turísticas e povo hospitaleiro. Na primeira reportagem destacamos o pioneirismo da Rasip e o grande investimento da Campestre, em Vacaria. Na sequência, Aracuri, Lemos de Almeida e Sopra, as vinícolas boutique com vinhedos implantados em Muitos Capões. Para finalizar, apresentamos a vinícola Sozo, de Monte Alegre dos Campos. 

Obrigada pela companhia e boa leitura. 

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A região de maior altitude média do Rio Grande do Sul, onde fica o pico Monte Negro, por exemplo, com seus 1398 metros acima do nível do mar, é um paraíso para quem gosta dos vinhos frescos, cheios de uma acidez que te faz salivar e querer provar mais um gole. Também para quem gosta de brancos de guarda, há belas surpresas por lá. Os catorze municípios dos Campos de Cima da Serra têm diferentes atrativos, e a produção de uva e de vinhos em boa parte deles certamente é um dos maiores.  

Na zona rural de Monte Alegre dos Campos, a cerca de 18 quilômetros de distância de Vacaria, a principal cidade da região, ficam os 12 hectares de vinhedos da família Sozo.  A propriedade poderia se chamar também Portal dos Carvalhos, uma das marcas que os Sozo, pai e filho, José e Rodrigo, utilizam em seus negócios. 

Porque foi Rodrigo, o filho, que trouxe as sementes de diferentes espécies de carvalho, francês e americano, nos bolsos. “Morei quinze anos fora do Brasil então sempre fui juntando as sementes e a cada viagem eu trazia pro pai reproduzir”, explica, “tem mudas até dos Jardins do palácio de Versailles”, conta.  

Talvez esteja em Monte Alegre dos Campos o único bosque de carvalho do Brasil, arrisca Rodrigo: “penso que devemos ter entre 500 e 600 carvalhos plantados aqui, sementes que vieram inicialmente de Santa Catarina, depois da França, da Bélgica, da Itália e dos Estados Unidos: uma grande biodiversidade”.  Os primeiros plantios, feitos na década de 90, beiram 40 anos, mas ainda estão distantes da idade de corte para transformação em barricas – cerca de 60 anos para o carvalho americano e 150 anos para o francês. Importante dizer que estes dados de tempo são europeus: no Brasil há bem mais insolação e as plantas desenvolvem mais rápido. “Temos indicação de que aqui talvez seja possível já com árvores entre 60 e 70 anos’, diz Rodrigo. 

A propriedade que foi adquirida por José Sozo no final dos anos 80, tem uma área de 120 hectares, com 20% deles preservados, o restante é dedicado principalmente à maçã e às nogueiras, mas nas duas últimas décadas o plantio de uva e a produção de vinho vêm cada vez mais ganhando espaço na região que é apontada por alguns como a ‘Borgonha brasileira’.  

Para muitos isso pode parecer exagero, mas em 2013 pai e filho estiveram na tradicional região produtora do Velho Mundo e apontaram semelhanças: “o estilo de frio que temos aqui, por exemplo, é muito parecido com o que eles têm por lá”, diz Rodrigo. 

Mas foi bem antes, no ano 2000, que Sozo pai começou a preparar o solo para receber as uvas. No ano seguinte implantou as primeiras variedades, Chardonnay e Merlot. Na sequência veio a Pinot Noir e então, em 2010, foi um dos pioneiros no Brasil com o plantio da Petit Verdot, com mudas trazidas do Uruguai. Dois anos depois novamente saiu na frente lançando o primeiro varietal da uva no país. “É a uva mais tardia da região”, conta, “e resulta em um vinho excelente e muito equilibrado quando vinificado sozinho, mas também fica muito bom em cortes com Cabernet e Merlot como fazem os franceses”, comenta, “e dá um grande vinho”, garante. 

O sobrenome Sozo é muito associado entre os produtores de vinho do Brasil a um vinhedo de excelência. Há uma grande procura pelas suas uvas para a produção de vinhos de vinícolas de diferentes regiões do estado e do país. É comum entre os produtores ouvirmos as expressões a ‘Sauvignon Blanc do Sozo’, a ‘Pinot do Sozo’, ou a ‘Franc do Sozo’, por exemplo, e isso, claro, passa por um qualificado trabalho de implantação, manutenção e condução dos vinhedos, tratados com as práticas de agricultura sustentável, buscando sempre a menor intervenção possível no vinhedo, com o objetivo de expressar a máxima qualidade das uvas. “Há três anos já não aplicamos nenhum herbicida, para favorecer a biodiversidade e a qualidade microbiológica do solo”, afirma Rodrigo.

A distribuição das parcelas no vinhedo – um terreno de solo argilo-basáltico com relevo diferenciado, pequenos vales, baixios e pontos mais altos – foi escolhida em função do ponto de brotação de cada uma das variedades. Além disso, estar em uma área junto com as maçãs agiliza o trabalho no vinhedo, diz José, “a mão de obra pode ser utilizada onde for necessária naquele momento e deslocada quando for o caso”, sentencia. 

O amor pela pesquisa de variedades é algo muito perceptível ao acompanhar o trabalho de pai e filho no vinhedo. Uma parcela bem razoável da área de plantio está reservada a um ‘jardim de experiências’, um espaço para quase cinco dezenas de variedades e diferentes clones de uvas de diversas partes do mundo, dezoito delas estudadas mais de perto há quatro anos pelos Sozo em parceria com o produtor James Carl, da vinícola Negroponte, de Monte Belo do Sul (RS), um reconhecido entusiasta das variedades não tradicionais. “Estamos fazendo um trabalho de castas esquecidas, buscando, quem sabe, uma nova identidade para os espumantes da região”, argumenta James, “começamos com microvinificações de Peverella”.  

Mas além dela, há diversas fileiras nos vinhedos com uvas não tão convencionais, como as gregas Xinomavro, Mavrotragano; as georgianas Saperavi, Alexandrouli e Chinuri; as portuguesas Loureiro e Gouveio e a italiana Nosiola, entre outras, além de clones de Pinot Noir, alemães, suíços e franceses da região do Jura. “Entre as tintas o melhor resultado que alcançamos até agora foi com a Montepulciano”, comemora James, “mas as respostas de Saperavi, Rebo e Barbera também foram excelentes. E a Nebbiolo, por exemplo, foi uma grata surpresa”, comemora. Agora o foco das pesquisas é nas gregas Mavrotragano e Xinomavro, variedades tintas que de acordo com James lembram a Nebbiolo.  As variedades deste jardim de experiências são microvinificadas.

Um dos grandes objetivos destas pesquisas é conhecer o potencial de Campos de Cima da Serra. “Começamos visitando a região de São Joaquim (SC) para ver o aproveitamento de variedades italianas como Teroldego, Barbera, Montepulciano, Sangiovese, Rebo, Peverella, Aglianico e Nebbiolo”, explica Rodrigo, “a partir dali fomos ampliando nosso universo de pesquisa, temos também plantadas Corvina, Rondinella e Molinara, as variedades do Amarone, e Nerello Mascalese, também conhecida como a uva do Etna.” 

“A Pinot Noir é um clássico, é a uva da nossa região, mas estas pesquisas nos fazem compreender qual a aptidão dos Campos de Cima da Serra para novas variedades “, diz Rodrigo.  

Em qualquer atividade, é importante sempre olhar para a frente.

 

Fotos: Brasil de Vinhos 

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A jornalista Lucia Porto viajou a convite da Associação das Vinícolas de Campos de Cima da Serra. 

 

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