Vinho brasileiro: os desafios da produção nacional em busca da excelência

Vinho brasileiro: os desafios da produção nacional em busca da excelência

Durante uma conferência on-line para prever os desafios da atividade vitivinícola mundial nos próximos 20 anos, realizada no final de junho, o diretor geral da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), Pau Roca, apontou uma tendência que o Brasil e, mais especificamente o Rio Grande do Sul, começaram a descobrir não tem muito tempo.

Segundo ele, a intensa conexão do vinho com o seu terroir e suas origens é uma das grandes forças do setor, que possibilitará o desenvolvimento da cadeia em sua diversidade, de forma sustentável, nas próximas décadas.

Pouco mais de um mês antes da fala de Roca, um recanto do Brasil confirmava a importância do reconhecimento do território para comprovar a qualidade dos seus vinhos. No começo de maio, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) publicou a concessão da Indicação Geográfica para a Campanha Gaúcha, cujos vinhos poderão exibir o selo que aponta a região em que foram produzidos e as regras segundo as quais são vinificados.

A mais jovem das Indicações de Procedência (IPs) concedidas no País demonstra o potencial de um setor que nasce e se desenvolve no campo, mas está bem longe de ser o que chamamos de commodity. Com um ciclo de altíssimo valor agregado, o vinho ainda é pouco apreciado no Brasil, mas o cenário muda rapidamente. O Rio Grande do Sul, berço do vinho nacional, lidera essa jornada.

Dados da consultoria Ideal Consulting, especializada no segmento de bebidas, demonstram que os brasileiros beberam, em 2019, pouco mais de 380 milhões de litros de vinho – parece muito, mas isso representa um consumo per capita de somente 2,3 litros, o que nos deixa muito atrás de gente como os portugueses, os franceses ou os argentinos, que bebem 62, 50 e 25 litros respectivamente, segundo a OIV.

O dado, porém, está longe de ser ruim. Pela primeira vez na história, a média dos consumidores brasileiros ultrapassou os dois litros. No ano que vem, provavelmente, essa marca será ainda melhor, impulsionada pelo crescimento de 12% no consumo de vinhos e espumantes durante a quarentena imposta pela pandemia de Covid-19, segundo levantamento da Ideal Consulting.

Para o presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE), Daniel Salvador, o Rio Grande do Sul, onde ainda é produzido cerca de 90% do vinho brasileiro, está preparado para essa expansão. “Como enólogo, posso dizer que vivemos a melhor fase do vinho brasileiro. Foram anos investindo em viticultura e na modernização das vinícolas. A safra 2020, por exemplo, é um marco”, destaca. As condições climáticas excepcionais, diz Salvador, aliadas ao conhecimento e tecnologia, permitiram “transformar essas uvas perfeitas em grandes vinhos”. Agora, completa, o setor está pronto para colher esses frutos.

Um levantamento da ABE demonstra que os vinhos brasileiros estão cada vez melhor posicionados mundialmente quando o assunto é qualidade, tendo arrematado cerca de 4,5 mil medalhas em concursos internacionais nos últimos 10 anos. Somente nos primeiros meses de 2020, o Brasil trouxe para casa 25 medalhas de disputas em países como Portugal, Espanha e França.

Território aberto para descobertas e experiências

O selo de Indicação Geográfica de uma região produtora e o enquadramento dos produtos nos padrões de qualidade exigidos pela distinção são a ponta de um processo que não reflete, necessariamente, o panorama geral da viticultura nacional. Basta ver os dados do Cadastro Vinícola feito pelo governo do Rio Grande do Sul, que revelam o perfil do produto gaúcho.

Dos mais de 182 milhões de litros de vinho produzidos no Estado em 2019, pouco mais de 37 milhões são de vinhos finos. O restante é o vinho de mesa, que chamamos carinhosamente de colonial, normalmente vendido em garrafões. Esse produto de custo mais baixo fica distante do paladar esperado pelos apreciadores da bebida.

De toda a produção nacional, 80% ainda é de vinho de mesa, o comum, feito com uvas americanas. O vinho fino, por sua vez, é elaborado com uvas da espécie vitis vinífera, originárias da Europa, específicas para a produção da bebida. Esse perfil vinícola tem uma origem histórica. De acordo com o jornalista Irineu Guarnier Filho, especializado em vinhos e estudioso do assunto, os imigrantes europeus, no século 19, trouxeram mudas de uvas viníferas dos seus países, especialmente as variedades tradicionais na Itália, como as tintas nebbiolo e sangiovese e a branca peverella. Essas plantas, porém, não se adaptaram bem ao solo gaúcho e morreram. As uvas americanas, mais resistentes e adaptáveis, foram a solução para que os imigrantes seguissem produzindo e bebendo seu sagrado vinho de cada dia.

A reconversão dos vinhedos e a dedicação dos produtores ao plantio de uvas viníferas foi possível graças à antiga técnica do enxerto, que tornou possível o cultivo de uvas europeias em qualquer lugar, aproveitando as raízes de uma videira resistente. Esse processo está em curso no Brasil de forma mais intensa, pelo menos, desde os anos 1980, tendo iniciado na mesma serra gaúcha onde reinava o vinho de mesa. Mas ainda há um longo caminho pela frente.

Muita gente, de variadas áreas, está dedicada a participar dessa transformação. Com projetos pipocando em todos os cantos do País – já há produção de grandes vinhos no interior de São Paulo, por exemplo -, fica evidente essa tendência. Foi pensando em mostrar essa diversidade que um grupo de amigos criou a plataforma Brasil de Vinhos, um portal cujo propósito é divulgar a colcha de retalhos do vinho brasileiro. “Sabemos que a maior parte da produção nacional é gaúcha, mas queremos revelar que o Brasil é um país de vinhos, divulgar vinícolas e negócios relacionados ao vinho em todo o Brasil, para que as pessoas conheçam e apreciem” comenta a jornalista Lucia Porto, uma das idealizadoras do projeto.

No site e nas redes sociais, as vinícolas, mercados e lojas se cadastram gratuitamente para compor essa grande vitrine do vinho nacional. Quando o perfil Brasil de Vinhos entrou no ar no Instagram, havia 54 vinícolas cadastradas. Hoje são mais de 140, e a equipe tem o cadastro pronto de 197 vinícolas, que deve entrar no ar enquanto você lê esta reportagem.

Quanto mais se descobre a vocação vitivinícola de cada região, mais atraentes se tornam os negócios inseridos nela. Como em outras áreas do agronegócio, é comum ver membros da família de produtores voltando a trabalhar no ramo. Foi o que aconteceu com o farmacêutico Daniel Panizzi, que tocava o projeto mais importante de sua carreira no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, quando precisou tomar a decisão de assumir a administração da vinícola Don Giovanni, fundada pelos sogros Ayrton e Beatriz, em Pinto Bandeira. “Alguém assumia ou eles venderiam a vinícola. Foi uma mudança e tanto”, relembra Panizzi.

O maior desafio tem sido encontrar a vocação do terroir de Pinto Bandeira e apostar nele, levando modernidade ao negócio, sem deixar de lado a tradição familiar. “Não queremos mais imitar o estilo de vinho do Chile ou plantar cabernet sauvignon porque todo mundo quer. O papel da nova geração é descobrir quem somos. Já sabemos, por exemplo, da excelência dos vinhos base para espumante que produzimos aqui. Algumas tintas, como a cabernet franc, também se adaptaram bem. Assim construímos nossa identidade e conquistando novos consumidores com um produto de altíssima qualidade que só existe aqui”, destaca.

Como a viticultura está distribuída no território gaúcho

Indicações Geográficas podem ser IP (Indicação de Procedência) ou DO (Denominação de Origem)

Vale dos Vinhedos: Primeira (e única, até agora) região do país a receber o selo de Denominação de Origem (DO), o Vale dos Vinhedos é a região produtora mais conhecida. Para que recebam o selo, os rótulos precisam ser inteiramente produzidos no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves, desde o cultivo da parreira até o envase, com um rígido controle de qualidade e sob um regramento específico. A variedade emblemática para a produção de tintos é a Merlot, com a possibilidade de uso de Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Tannat como auxiliares para corte. Já entre as brancas, a principal é a Chardonnay, com o Riesling Itálico como variedade auxiliar para corte. Já para a elaboração de espumantes, Chardonnay e Pinot Noir são as principais. O Riesling Itálico entra como coadjuvante em cortes.

Farroupilha: Essa Indicação de Procedência é exclusiva para a produção de vinhos finos moscateis, incluindo espumantes, vinho fino tranquilo branco, frisante, licoroso moscatel, mistela e brandy. É a região brasileira com maior volume de produção de uvas moscato. A IP se estende por uma área de 379 quilômetros quadrados no município de Farroupilha, com pequeníssimas áreas localizadas em Caxias do Sul, Pinto Bandeira e Bento Gonçalves.

Altos Montes: A altitude é a característica desta região, a mais alta da Serra Gaúcha. Nos montes que chegam a 885 metros, são cultivadas as uvas para a produção de espumantes e de vinhos tranquilos, brancos e tintos. Com temperaturas mais amenas, a maturação das uvas é mais longa, o que confere uma personalidade única aos vinhos. A área da IP se estende por 174 quilômetros quadrados, entre os municípios de Flores da Cunha e Nova Pádua.

Monte Belo: Uma das menores regiões a receber indicação geográfica, Monte Belo conta com 56 quilômetros quadrados, nos quais cerca de 600 produtores extraem o máximo do terroir para garantir a alta qualidade das uvas. Cerca de 80% da IP fica no território de Monte Belo do Sul, com o restante se dividindo entre Bento Gonçalves e Santa Tereza, próximo ao Vale do Rio das Antas. Os vinhos tranquilos e espumantes elaborados integralmente com as uvas produzidas na região recebem o selo da IP.

Pinto Bandeira: Localizada entre os municípios de Pinto Bandeira, Farroupilha e Bento Gonçalves, esta região tem altitude mínima de 500 metros, além de clima ameno, o que possibilita um ciclo longo da videira, com maturação lenta e colheita um pouco mais tardia. Na área de mais de 81 quilômetros quadrados são produzidos vinhos tranquilos brancos, rosés e tintos, além dos espumantes, considerados por muita gente os melhores do Brasil. Uma curiosidade: somente os espumantes elaborados pelo método tradicional recebem o selo da IP.

Campanha Gaúcha: Última IP a ser reconhecida pelo INPI, em maio, a Campanha é a maior das IPs brasileiras, com uma área de mais de 44 mil quilômetros quadrados, que se espalha por 14 municípios: Aceguá, Alegrete, Bagé, Barra do Quaraí, Candiota, Dom Pedrito, Hulha Negra, Itaqui, Lavras do Sul, Maçambará, Quaraí, Rosário do Sul, Santana do Livramento e Uruguaiana. Um solo pedregoso, de topografia levemente ondulada, com invernos frios e verões quentes e pouca chuva é ideal para a produção de vinhos de alta qualidade.

Vales da Uva Goethe: Primeira IP registrada em Santa Catarina e única fora do Rio Grande do Sul, a região produz a tradicional uva Goethe, que chegou ao estado no início do século 20. Recebem o selo os vinhos branco e leve branco, que podem ser secos, meio secos ou suaves. Também são produzidos espumantes e licorosos. A região de abrangência desta IP se localiza em 459 quilômetros quadrados entre as encostas da Serra Geral e o Litoral Sul de SC, nos municípios de Urussanga, Pedras Grandes, Morro da Fumaça, Cocal do Sul, Treze de Maio, Orleans, Nova Veneza e Içara.

Indicações Geográficas em Estruturação

Altos de Pinto Bandeira: Os estudos desenvolvidos nessa região pretendem criar uma Denominação de Origem para espumantes produzidos nas partes mais altas do entorno de Pinto Bandeira, que chegam a 700 metros de altitude. As bebidas reconhecidas serão produzidas somente pelo método tradicional, a partir das variedades Chardonnay, Pinot Noir e Riesling Itálico.

Planalto Catarinense: A Serra Catarinense tem se consolidado, desde o começo dos anos 2000, como produtora de vinhos de altitude. Muitos projetos têm surgido, revelando as potencialidades do terroir que se destaca pela altitude e pelas baixas temperaturas. Destacam-se as cidades de São Joaquim, Caçador e Campos Novos.

Vale do São Francisco: Com cerca de 500 hectares de vinhedos da espécie vitis vinífera, a região de clima tropical semiárido produz uva o ano todo, com ciclo determinado pela irrigação com a água do Rio São Francisco. Os vinhos finos tropicais, tranquilos e espumantes, são produzidos na Bahia e em Pernambuco, no eixo Petrolina-Juazeiro.

Fonte: Embrapa Uva e Vinho

Promessa de expansão no maior terroir brasileiro

A suspensão de todas as atividades coletivas e de turismo em função da pandemia do novo coronavírus adiou uma festa há muito aguardada pelos produtores de vinho da Campanha Gaúcha. A comemoração solitária, no isolamento de cada propriedade, no entanto, não tirou o brilho do reconhecimento da região com a Indicação Geográfica conferida pelo INPI, a sexta em solo gaúcho.

O selo posiciona a campanha, que é o maior terroir brasileiro, com quase 443 mil hectares, na ponta da tendência mundial da busca pela identidade particular de cada vinho, diretamente ligada à região em que é produzido. “Demos mais um passo para ser a principal região produtora de vinhos do País. Estamos localizados entre os paralelos 28 e 31, os mesmos de outras regiões produtoras de grandes vinhos, e temos áreas disponíveis para atrair investidores”, salienta Valter Pötter, presidente da Associação Vinhos da Campanha Gaúcha.

Agora, completa ele, as vinícolas terão que fazer o seu dever de casa para cumprir os 18 requisitos necessários para obter o selo da IP. Muitas delas, porém, estão fazendo esse dever de casa há anos. Erguida em 2012, em Itaqui, a vinícola Campos de Cima vem buscando, desde então, o perfil de produto que reflita de forma mais ampla a personalidade da região. Com uma produção anual que fica em torno de 60 mil garrafas, a equipe de enologia busca as variedades que melhor se adaptem ao clima e ao solo da propriedade.

Dessa busca, nasceram rótulos como o 3 Bocas, em referência aos paladares das mulheres que fundaram a vinícola, um corte de tannat, ruby cabernet e cabernet sauvignon, uvas cujo desenvolvimento tem se mostrado excelente na Campanha.

Os novos projetos, como tintos varietais e espumantes, seguem a mesma premissa de descobrir a vocação natural do solo. “Existe uma identidade própria na Campanha, que se reflete nos vinhos. Tintos alcoólicos e estruturados, espumantes gastronômicos, tudo isso revela as condições ímpares desse lugar”, comenta Pedro Candelária, diretor comercial da Campos de Cima.

Produção de uvas no Rio Grande do Sul (em quilos)

Viníferas

  • 2015 – 70.558.445
  • 2016 – 32.333.798
  • 2017 – 77.403.352
  • 2018 – 65.653.966
  • 2019 – 70.580.814

Americanas

  • 2015 – 632.712.943
  • 2016 – 267.965.049
  • 2017 – 675.091.698
  • 2018 – 598.551.058
  • 2019 – 543.698.390

Fonte: Cadastro Vinícola RS (Sisdevin)

Enoturismo deve crescer no pós-pandemia por garantir pouca concentração de público

À medida em que se diversificam os empreendimentos vinícolas, cresce junto um tipo muito particular de turismo, que deve ganhar um novo impulso no mundo pós-pandemia. O enoturismo, que já vinha em ascensão, ganha nova relevância por ser capaz de oferecer experiências seguras, com pouca concentração de pessoas e ao ar livre.

Na opinião da consultora em enoturismo Ivane Fávero, o Rio Grande do Sul é o polo que inaugurou essa modalidade, se mantendo sempre como um celeiro de inovação nesse setor. “Especialistas do mundo todo afirmam que o enoturismo vai crescer. Na Europa, por exemplo, já vive a retomada, sendo uma das modalidades de turismo mais procuradas. É seguro visitar vinícolas por que todas já adotavam, antes, rigorosos protocolos de higiene em função de sua produção. Como ficam no interior das cidades, não oferecem um turismo massivo. As visitas são mais exclusivas, muitas ao ar livre, o que indica boas possibilidades para o setor”, destaca Ivane.

O caminho, segundo a consultora, é traduzir para o turista a essência de cada região – movimento que a Campanha Gaúcha, por exemplo, já está fazendo. Além da visitação às vinícolas, a região precisa ter uma boa oferta agregada, com hotéis, restaurantes, artesanato, e atividades complementares. “A Campanha está trabalhando no seu conceito, que é diferente da Serra ou do Vale dos Vinhedos. É uma região muito grande, que o turista não percorre em um dia. Esse conceito bem definido vai chamar o público para os atrativos da região”, completa.

Muitas uvas, muitos lugares, muitos projetos

Segundo o Cadastro Vinícola divulgado pela Embrapa em 2017, são cultivadas 138 variedades no Rio Grande do Sul, entre americanas e vitis vinífera. No segmento de uvas destinadas à produção de vinhos brancos, a chardonnay é a campeã, utilizada em vinhos tranquilos (como se chamam os vinhos que não possuem gás) e espumantes. Nas tintas, a cabernet sauvignon ainda domina, seguida pela merlot.

Com o tempo, porém, outras variedades têm se destacado por sua adaptação ao território: cabernet franc, tannat, e tempranillo, entre as tintas, e riesling itálico, entre as brancas, capturam a atenção dos enólogos. A onipresente cabernet sauvignon vai aos poucos perdendo espaço, especialmente na Serra Gaúcha, onde nunca se adaptou bem em função de seu ciclo mais longo de maturação.

As muitas cepas encontram solos diferentes para florescer. Aos poucos, vai-se descobrindo microrregiões distintas dentro do Rio Grande do Sul capazes de revelar vocações inesperadas para diferentes tipos de vinho. A Serra Gaúcha, que ainda concentra o maior número de vinícolas, é agora desmembrada em pequenos terrroirs, cada um com um talento diferente. Pinto Bandeira, por exemplo, faz os melhores espumantes do Brasil.

Os tintos de Monte Belo surpreendem pela elegância. O merlot do Vale dos Vinhedos está cada vez melhor. Mas não é só de Serra Gaúcha que vive um aficionado pela bebida. Além das qualidades da Campanha, outras partes do Rio Grande do Sul tornam-se referência em viticultura. Os Campos de Cima da Serra, cujos melhores brancos lembram os icônicos Chablis, e a Serra do Sudeste, que tem 96% de seus vinhedos plantados com vitis vinífera, são exemplos dessa diversidade.

Diferentes projetos germinam em meio a essa variedade. No Noroeste gaúcho, quase na fronteira com a Argentina, uma vinícola quebra a monotonia dos campos cobertos de soja. Aproveitando um solo basáltico de relevo ondulado e o clima quente e seco no verão e muito frio no inverno, a Weber descobriu, nos anos 2000, que Crissiumal também é terra de vinho.

“Uma das principais características que o terroir aporta nos nossos vinhos é boa acidez. Os vinhos tintos, mesmo sendo colhidos com a uva bem madura, ainda apresentam boa acidez, o que é importante para a guarda. Também é um fator muito interessante no caso dos espumantes, já que a acidez está diretamente ligada ao frescor do produto”, explica a enóloga e sócia do empreendimento, Taciana Weber.

Para as cerca de 15 mil garrafas anuais, a Weber cultiva 10 variedades, entre elas algumas pouco conhecidas como as tintas marselan e teroldego e as brancas moscato poloski e moscato alexandria. Além dos 20 hectares de vinhedos, a Weber recebe visitantes na cantina onde o enoturismo é, ou era, até antes da pandemia, a principal forma de divulgação dos produtos.

E se você imaginasse uma vinícola dentro de Porto Alegre, na zona mais urbana da cidade, no bairro Chácara das Pedras? Sim, isso existe. A Bodega Ruiz Gastaldo é a expressão das imensas possibilidades que recém começam a ser descobertas no universo do vinho gaúcho. Para a primeira safra, em 2016, Eduardo Gastaldo, o fundador, subiu a serra com uma caixa d’água de 500 litros na carroceria de uma F-250 para trazer 400 quilos de uva, que foram vinificados no galpão de sua casa, na Capital.

Desde então, ele aprimora o transporte da matéria-prima e os métodos de vinificação, para oferecer ao público uma experiência diferente e surpreendente. “A fermentação alcoólica iniciou dentro da caçamba. Quando terminou essa primeira etapa, bombeamos para a bodega e ali começou o amadurecimento. O vinho ficou pronto no final de 2017, mesmo ano em que nasceu meu primeiro filho. Por isso, o rótulo chama-se João Pedro”, relembra Eduardo.

A primeira safra não chegou a 400 garrafas. Em 2019, a produção foi de 2 mil garrafas e, nesse ano, a expectativa é colocar no mercado algo perto de 3 mil unidades. O estilo de vinificação é inspirado, segundo o fundador, nos vinhos do velho mundo, menos alcoólicos, com acidez presente e taninos macios e equilibrados.

Com o conceito de bodega urbana, Eduardo e a família recebiam visitantes – antes da pandemia – para experiências enológicas, como degustações, no anexo da casa que se transformou na vinícola.

Seus rótulos são vendidos em algumas lojas especializadas de Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro. “Comecei a gostar de vinho em função da minha esposa, mas depois descobri que tenho a bebida na história da minha família. Meu avô, imigrante, plantava uva e fazia vinho aqui na Independência. As possibilidades são inúmeras, estamos explorando uma delas. Por que não fazer vinho em Porto Alegre?”, questiona Eduardo.

O setor em números

Cidades com mais vinícolas

  • Flores da Cunha: 121
  • Caxias do Sul: 63
  • Bento Gonçalves: 60
  • Garibaldi: 47
  • Farroupilha: 26
  • Antônio Prado: 23
  • Nova Pádua: 21
  • Monte Belo: 17

Total de estabelecimentos

  • Vinícolas do RS: 613

Produção (safra 2019, em litros)

  • Vinho de mesa: 144.629.737
  • Vinho fino tranquilo: 37.615.421
  • Total de vinhos: 182.245.158
  • Total de espumantes: 3.993.417

Fonte: Cadastro Vinícola RS – Sisdevin – Atualizado em junho de 2020

Regiões Produtoras

  • Serra Gaúcha
  • Serra do Sudeste
  • Campanha Gaúcha
  • Campos de Cima da Serra
  • Alto Uruguai
  • Região Central

Fonte: Ibravin

(matéria assinada pela jornalista Patricia Lima, publicada no caderno Empresas & Negócios do Jornal do Comércio, 20/07/2020. Foto: divulgação vinícola Campos de Cima)

 

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