“Que baita notícia tivemos ontem!”. A frase entusiasmada foi dita por Valter Pötter, produtor de vinhos na Campanha Gaúcha. O proprietário da vinícola Guatambu, uma das mais tradicionais da região, localizada na cidade de Dom Pedrito, na Campanha Gaúcha, próxima ao Uruguai e Argentina, tradicional também pela pecuária e culturas como a soja, se referia à decisão judicial proferida pela juíza Patrícia Antunes Laydner, da Comarca de Porto Alegre, que acolheu pedido formulado por associações de produtores de maçãs e vinhos finos e determinou a proibição imediata do uso do herbicida hormonal 2,4-D em toda a região da Campanha Gaúcha, além de restringir sua aplicação em outras áreas do Estado.
Em fevereiro de 2025, em matéria publicada aqui no Brasil de Vinhos, a engenheira agrônoma Gabriela Pötter apresentou números alarmantes: “calculamos as perdas anuais em cerca de 30% da produção de uvas”, disse a diretora técnica da Guatambu, que completou que de 2017 até 2024 a vinícola registrou um prejuízo de mais de R$ 21 milhões. A produtra contou ainda que em 2020 deixou-se de produzir na Campanha em torno de 780 toneladas de uvas – aproximadamente um milhão de garrafas de vinhos finos. Em depoimento publicado em nosso instagram Gabriela relatou prejuízos da Guatambu na safra 2025 e fez um apelo por mudanças, meses depois foi instalada uma subcomissão para tratar do tema na Assembleia Legislativa e audiências públicas começaram a ser realizadas.
O advogado Valtencir Gama, que além de especialista no tema também é produtor de uvas na região de Camaquã detalha: “cada viticultor teve os seus prejuízos em razão deste uso do herbicida 2,4-D nas lavouras, principalmente nas de soja. Esse 2,4-D é um herbicida que é utilizado nas lavouras de soja em uma época que coincide com a floração das videiras, e daí vem a causar o problema dentro dos vinhedos”, explica, “o que eu estou dizendo é que além da perda da safra ou da redução da produtividade em função da dessa contaminação há casos também até de perda do próprio vinhedo”, relata.
Gama explica que o vinhedo vai sendo contaminado ao longo dos anos pela deriva do 2,4-D e pode chegar num ponto que que se perde toda a plantação. “Os prejuízos dos vitivinicultores e dos fruticultores – porque entra aqui também a questão das olivas e maçãs, por exemplo – são enormes, são prejuízos de grande monta”, desabafa, “é extremamente importante que os vitivinicultores procurem um suporte jurídico para tratar da sua situação de forma individual”, aconselha. Em matéria publicada no portal Agrolink o jornalista Leonardo Gottems apresenta a questão da proibição de forma detalhada.
Apesar da decisão agora ser muito positiva, Gama alerta para outra questão: “essa sentença proibiu o uso na Campanha Gaúcha, mas e as outras regiões vitivinícolas aqui do estado do Rio Grande do Sul, como, por exemplo, os Campos de Cima da Serra, ou a região noroeste do estado?”, questiona o advogado, “temos casos em Santa Maria e Jaguari do Sul, que reduziu sua área de plantio para talvez um terço, o pessoal desistiu de plantar uva lá, em função do 2,4 D”, alerta. “E as outras regiões do estado, como ficam? Porque a proibição desta sentença, ainda não transitada e julgada, é para a Campanha Gaúcha”, salienta. No dispositivo da sentença consta proibir o uso e a aplicação de herbicidas hormonais com princípio ativo 2,4-D em todo o território da região da Campanha Gaúcha, bem como a uma distância inferior a 50 (cinquenta) metros de lavouras de uva (videiras) e maçã (macieiras) em todas as demais regiões do Estado do Rio Grande do Sul. Na opinião de Gama – advogado e produtor de uva e vinho – isso é pouco: “teria ser no mínimo 20 ou 30 quilômetros”, assegura, “porque há estudos que indicam que a deriva desse produto atinge estas distâncias”, relata.
O advogado reforça que essa pergunta pode ecoar mais longe: “e as demais regiões do Brasil, que também têm lavouras, vinhedos, produção de uva, cultivo de uva e cultivo de soja próximos, como ficam?” Gama salienta a importância de todas as culturas, mas pondera que devem subsistir de forma pacífica: “há que haver a coexistência harmônica entre as culturas”, reforça, “ninguém está brigando entre soja e uva, não é isso, a questão é o herbicida”.
Foto: Brasil de Vinhos | Lucia Porto
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